sábado, 4 de junho de 2011

Relacionamento

Sabemos como foi uma paixão pelo modo como ela termina. Esta frase está no livro “O passado”, do argentino Alan Pauls, mas não precisaria estar em livro nenhum para que a avalizássemos. A maneira como se coloca o ponto final nas relações deixa evidente o verdadeiro espírito que norteou o que foi vivido.

Que tipo de final desejamos? De preferência, nenhum. Todos querem um amor para sempre, desde que ele se mantenha estimulante, surpreendente, à prova de tédio. Ou seja, um amor miraculoso. Como milagre é do departamento das coisas impossíveis, é natural que as relações durem alguns anos, ou muitos anos, e depois acabem. Lei da vida. Sofre-se o diabo, mas raros são aqueles que nunca passaram por isso. O que fazer para amenizar a dor? Talvez ajude se analisarmos o final para entender como foi o durante.

Há os finais chamados civilizados. Ambos os envolvidos percebem o desgaste do relacionamento, conversam, tentam mais um pouco, conversam novamente, arrastam a história mais uns meses, veem que nada está melhorando, aguardam passar o Natal e o Ano-Novo, fazem uma última tentativa e então decidem: fim. Lógico que é dilacerante. Não é fácil fazer uma mala, dividir os pertences e estipular visitas aos filhos, quando há filhos. A solidão espreita e assusta, e um restinho de dúvida sempre surge na hora do abraço de despedida. Mas foi um the end sem derramamento de sangue. Como conseguiram a façanha? Provavelmente porque sempre escutaram um ao outro, porque não fizeram da relação um campo minado, porque as brigas eram exceções e não regra. É possível também que a relação fosse mais racional do que animal: ternura é bem diferente de paixão. Mas, enfim, mesmo sofrendo com a ruptura, deram a ela um fim digno, condizente com o que de bacana viveram juntos.

Agora vamos ao outro tipo de separação. Tire as crianças da sala.

A relação acaba geralmente depois de um ataque de ofensas, de uns “não aguento mais”, de muita choradeira, de cortes na alma, de desconstrução total. Garanto que se amam mais do que aquele casal que se separou assepticamente, mas perderam toda a paciência um com o outro, e também todo o respeito, e atingiram um limite difícil de transpor. Por que, depois desse quebraquebra, não tentam um papo conciliador? Ora, porque não fazem a mínima ideia do que seja isso.

Sempre foram atormentados pelo ciúme, pelas implicâncias diárias, pela alternância de “te amo” e “te odeio”. Terminam falando mal um do outro para quem quiser ouvir, e não raro aprontam umas vingançazinhas. Tudo muito longe do sublime.

Tive um vizinho que gritava com a namorada ao telefone, sem se importar que o prédio inteiro ouvisse: — Não sei o que fazer! Fico mal contigo e fico mal “sentigo”! Sempre achei essa situação desoladora, e nem estou falando do português do sujeito. É duro ter apenas duas alternativas (ficar ou ir embora), e ambas serem terríveis.

Quando acaba docemente, é sinal de que você foi feliz e nada há para se lamentar. Se acaba de forma azeda, é porque a relação era mesmo uma neura e tampouco se deve lamentar. Nos dois casos, a performance final ao menos ajuda a compreender o que foi vivido e a se preparar para um novo amor que não acabe nunca. Em tese.

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