domingo, 28 de abril de 2013

Sensibilidade e bom senso


Nunca duas palavras caminharam tão de costas viradas como estas. Sensibilidade desafia o bom senso e o bom senso poe rédeas na sensibilidade, trava-lhe o instinto, e disseca-lhe cada um dos sentidos que esta desperta. Gostava de ter suficiente bom senso para suplantar os desejos inconscientes da sensibilidade, mas todos sabemos que uma vírgula que mudássemos deixaria de ser nós mesmos e passaríamos a ser apenas uma bonita imagem com ténues e superficiais semelhanças aquela que sempre conhecemos e agora por capricho queremos descartar.
Na verdade é a realidade de todos nós. Consciente ou inconscientemente, todos nos deixamos tocar por estas duas palavras. Gostava de dizer que tenho o dom de expressar em palavras a sensibilidade que me inquieta, gostaria de partilhar o bom senso e beber o que me falta em momentos que devia ser dona do mesmo, e no entanto acabo dela escrava.
Nos dias quentes de verão, ou até primavera, em que sopra aquele vento suave, que é demasiado perceptível para ser uma brisa, mas tão suave que a palavra vento parece por demais ríspida para o definir. Não quente, mas fresco, sem ser no entanto frio e desagradável, apenas no ponto em que sentimos a forma como nos acaricia a pele, como desperta os sentidos, como se ali, perante o mundo fizesse descaradamente amor com o corpo que deveria ser nosso. A forma tão terna como nos afasta as madeixas de cabelo dos olhos, como nos contorna os ombros num abraço tão envolvente que parece nos erguer no ar. A forma como cria á nossa volta um ambiente intimo e melodiosamente silencioso, para que possamos nele entrar deixando o tempo á porta, estático, parado e impotente. A sensibilidade está no seu auge nos momentos mais simples como que preenchendo o espaço deixado pela ausência da razão.
Quando enterro as mãos na areia quente, nos dias frios e solarengos de inverno, entre duas dunas de uma qualquer praia deserta, olhando o mar que dança conforme o ritmo da maré para meu total desfrute  e deixo que os pensamentos, perguntas e dúvidas que me levaram aquele lugar mergulhem nas suas águas profundas, sentindo os grãos de areia que me vão escorrendo entre os dedos, em mil e um beijos que carinhosamente me afagam, como um sussurro amigo, uma quietude que afasta a solidão desse momento e a transforma numa cumplicidade só nossa.
Nas alturas em que em desalento procuro um vazio onde descansar, longe de tudo mas sem sair do meu lugar, e me deito no escuro de um recanto, e bebo cada uma das palavras que tocam no meu ouvido, em músicas por outros criadas, mas que naquele instante faço minhas como se eu própria as tivesse escrito, espalhadas em notas que embalam o meu sentir, levando-o para lugares onde os sonhos nem ousam entrar, e a vida já não tem lugar. 
Quando inesperadamente alguém nos toca o braço nu, nos puxa suavemente para si, e nos dá um beijo tão suave que parece apenas um roçar dos lábios, tão longo que parece uma viagem a todos os  sentidos e demais desconhecidos, que nos toca tão fundo que mergulhamos para além dos limites da consciência.
Em todos estes lugares no tempo, onde não há tempo para começar nem tempo para terminar, onde não existe enredo nem história, apenas um sentir tão fundo e ao mesmo tempo tão efémero que tantas vezes acabamos por desvalorizar, colocando-o no mais recôndito do nosso pensamento, é onde a sensibilidade rainha, pega na alma sua serva, e desce a escadaria da torre dos sentidos, desprovida de bom senso, e sem as amarras da razão, e nos leva, sem que possamos resistir, para aquele lugar onde nada mais cabe, nem um suspiro, tão fundo, que sentimos que não conseguimos respirar. Poderia até pensar que tanta sensibilidade era apenas defeito meu, mas sei que não, sei que existe um desalento perante a falta de sensibilidade na imagem de vida supostamente perfeita, que existe uma porta que parece fechada mas que está apenas encostada, existe a consciência dum arrastar de insensibilidade como se dum conceito supérfluo se tratasse, quando a mesma seria como pintar a aguarela um quadro com os contornos perfeitos, mas onde os tons se foram esbatendo ao longo do tempo tornando quase impercebível as cores originais.
Porquê arranjar justificações para esta falta, com o tão maltratado tempo, atribui-se culpas ao tempo como se dele dependesse tudo. O tempo, como sempre se disse, vale pelo que fazemos dele, não é pouco nem muito é apenas tão importante quanto o nome que lhe damos. Não existe tempo, existe momentos que se entrelaçam uns nos outros e que percorremos, passamos ou desfrutamos acompanhados de um sol ou uma lua que os torna mais ou menos luminosos, mas não por isso mais ou menos sentidos. Quem disse que existe um tempo para amar, um tempo para parar, um tempo para ser feliz, e um tempo para ser irreverente. Quem disse que existe um tempo para aprender e um tempo para errar, um tempo para mudar e um tempo para ter tempo?
Resguardamo-nos da inquietude da sensibilidade, agarrando-nos a um tempo que teimamos em calendarizar, a um bom senso que nos serve de guia espiritual, e assim caminhamos cada vez para mais longe daquilo que deveríamos ser, apenas e somente humanos…

Eu quero

"Eu quero engolir rejeições, chorar alegrias, rir tristezas, despir a alma, gritar amores, sussurrar ofensas nem sempre controláveis, entender os porquês, dançar inimigos, abraçar amigos, beijar incertezas e acariciar a aprendizagem. Quero não me importar, quero largueza de fé e pessoas que confiam em mim. Eu quero confiar nas pessoas, quero mais dias de Sol com noites de chuva. Quero nunca me cansar. Quero me cansar e ter direito há um mês em uma Ilha Paradisíaca cheia de paisagem bonita, cheia de um azul sem fim. Quero a contradição. Quero o bonito e o azul em mim. Que os dias nunca pareçam longos, que a graça nunca pareça pouca. Quero luz dentro e fora de mim, quero paz por todos os lados. Quero trevo de quatro folhas para engolir a sorte azeda. Quero conseguir ser única e leve em um mundo de pessoas tão iguais, tão alienadas, tão cheias de si. Quero respostas na ponta do lápis. Quero me empolgar, me estressar, me amar assim como sou, empolgada e estressada na mesma quantidade. Quero tomar um banho de amor e compaixão para que todos os sentimentos ruins desçam pelo ralo. Quero compartilhar pensamentos sem medo do que possam pensar, quero o poder de provar como as coisas são, como elas foram e como serão. Quero picar a minha dor e colocá-la em uma caixa que não tem como ser aberta novamente. Quero picar a minha alegria e dividir com aqueles que amo. Quero alegria sem fim e tristeza com fim. Conversas sem hora para terminar, beijos sem ter o que pensar, abraços onde eu possa morar. Quero um jarro transparente cheio de gérberas laranja no canto do meu quarto. Quero conversar sem me importar. Quero ser sincera. Quero que não se ofendam com a minha sinceridade (que acreditem nela também.) Quero banhos de chuva e luau com amigos, quero um par de meias coloridas e um amor para aquecer. Quero levar tombo e rir da vida porque nem ela sabe quanta gente tenho para me ajudar a levantar. Quero amigos sinceros, dias claros e noites estreladas. Quero pintar o céu com lápis de cor em dias cinzas, quero descansar nas nuvens enquanto converso com heróis que foram cedo demais. Quero algodão-doce e vida doce, quero o doce entrando em minhas veias até me dar náusea e só me restar colocar para fora essa poesia toda, entalada em algum lugar de mim. E isso, eu não quero para 2013 não, eu quero para a vida!" 

O que acontece no meio...


''No meio, a gente descobre que precisa guardar a senha não apenas do banco, mas a que nos revela a nós mesmos.
Vida é o que existe entre o nascimento e a morte. 
O que acontece no meio é o que importa.
No meio, a gente descobre que sexo sem amor também vale a pena, mas é ginástica, não tem transcendência nenhuma. 
Que tudo o que faz você voltar pra casa de mãos abanando (sem uma emoção, um conhecimento, uma surpresa, uma paz, uma idéia) foi perda de tempo.
Que a primeira metade da vida é muito boa, mas da metade pro fim pode ser ainda melhor, se a gente aprendeu alguma coisa com os tropeços lá do início. Que o pensamento é uma aventura sem igual. Que é preciso abrir a nossa caixa preta de vez em quando, apesar do medo do que vamos encontrar lá dentro. 
Que maduro é aquele que mata no peito as vertigens e os espantos.
No meio, a gente descobre que sofremos mais com as coisas que imaginamos que estejam acontecendo do que com as que acontecem de fato. Que amar é lapidação, e não destruição. Que certos riscos compensam – o difícil é saber previamente quais. 
Que subir na vida é algo para se fazer sem pressa.
Que é preciso dar uma colher de chá para o acaso. Que tudo que é muito rápido pode ser bem frustrante. Que Veneza, Mykonos, Bali e Patagônia são lugares excitantes, mas que incrível mesmo é se sentir feliz dentro da própria casa. Que a vontade é quase sempre mais forte que a razão. Quase? Ora, é sempre mais forte.
No meio, a gente descobre que reconhecer um problema é o primeiro passo para resolvê-lo. Que é muito narcisista ficar se consumindo consigo próprio. Que todas as escolhas geram dúvida, todas. 
Que depois de lutar pelo direito de ser diferente, chega a bendita hora de se permitir a indiferença.
Que adultos se divertem muito mais do que os adolescentes. 
Que uma perda, qualquer perda, é um aperitivo da morte – mas não é a morte, que essa só acontece no fim, e ainda estamos falando do meio.
No meio, a gente descobre que precisa guardar a senha não apenas do banco e da caixa postal, mas a senha que nos revela a nós mesmos. Que passar pela vida à toa é um desperdício imperdoável. Que as mesmas coisas que nos exibem também nos escondem (escrever, por exemplo).
Que tocar na dor do outro exige delicadeza. Que ser feliz pode ser uma decisão, não apenas uma contingência. Que não é preciso se estressar tanto em busca do orgasmo, há outras coisas que também levam ao clímax: um poema, um gol, um show, um beijo.
No meio, a gente descobre que fazer a coisa certa é sempre um ato revolucionário. Que é mais produtivo agir do que reagir. Que a vida não oferece opção: ou você segue, ou você segue. Que a pior maneira de avaliar a si mesmo é se comparando com os demais. Que a verdadeira paz é aquela que nasce da verdade. E que harmonizar o que pensamos, sentimos e fazemos é um desafio que leva uma vida toda, esse meio todo. ''
 (Martha Medeiros)